terça-feira, 15 de setembro de 2009

Direito Processual Civil II - Trabalho de Denunciação da Lide e Chamamento ao Processo

Denunciação da lide e chamamento ao processo são espécies de intervenção de terceiros. O CPC prevê cinco tipos de intervenção de terceiros: a assistência, a oposição, a nomeação à autoria, a denunciação da lide e o chamamento ao processo. Trataremos, neste trabalho, apenas dos dois últimos.

Iniciaremos o estudo dos dois incidentes pelo chamamento ao processo, por ser este mais simples de ser compreendido. Após clareado o que vem a ser o chamamento ao processo, o diferenciaremos da denunciação da lide para então definir esse segundo, mais complexo.

CHAMAMENTO AO PROCESSO

O chamamento ao processo tem origem no direito português, onde é chamado de "chamamento à demanda".

No nosso ordenamento, chamamento ao processo é um incidente processual de intervenção de terceiros que amplia o pólo passivo da relação processual, por iniciativa do réu. O réu chama ao processo um terceiro, sob determinadas condições, tornando-se este terceiro litisconsorte passivo (também réu) ao lado do réu original da ação.

Como sabemos o processo inicia-se com a petição inicial e encerra-se com a sentença. Na petição inicial, ou autor define o réu (ou réus), a quem a lide deva ser imputada. Pode ocorrer que o réu, entretanto, não seja o devedor principal da obrigação cobrada, mas seja apenas um fiador ou devedor solidário de outros devedores. O autor, entretanto, optou por processar apenas aquele réu, não estando na petição inicial, portanto, o outro ou outros devedores.

Em situação normal, o réu responderia sozinho pelo processo e, caso saísse perdedor, poderia entrar com outra ação no intuito de, regressivamente, obter o ressarcimento dos outros devedores.

Para evitar a sobrecarga no poder judiciário com processos sucessivos de mesma natureza e para possibilitar ao réu o benefício de já resolver a sua situação com o autor e a sua situação com os outros devedores, é que se instituiu o chamamento ao processo.

O chamamento ao processo é prerrogativa do réu, podendo este exercer ou não este direito. Como vimos o chamamento ao processo não inaugura nova relação processual, mas sim promove uma alteração subjetiva na relação anterior, acrescentando um ou mais sujeitos no pólo passivo da relação (litisconsórcio passivo). Por ser instituto que visa o benefício do réu, só se admite o chamamento ao processo quando este o beneficiar.

O réu original pode beneficiar-se do chamamento ao processo tanto pelo auxílio dos litisconsortes na sua defesa, quanto pela finalidade de obter título executivo contra os devedores comuns, caso salde sozinho a dívida. Essa é uma das características do chamamento ao processo que é produzir, junto com a sentença, título executivo do réu original contra os outros devedores, se for o caso.

O art. 77 do CPC admite o chamamento ao processo nos seguintes casos:
  • chamamento do devedor, na ação em que o fiador for réu. Neste caso o fiador foi o réu originário, na ação original. Este fiador pode chamar o devedor principal ao processo para que ambos respondam pela dívida, em conjunto. A base para essa prerrogativa assenta-se no benefício de ordem.
  • chamamento dos outros fiadores quando para a ação for citado apenas um deles. Funda-se na solidariedade entre os fiadores.
  • chamamento de todos os devedores solidários, quando o credor exigir de um ou de algum deles, parcial ou totalmente, a dívida comum. É prerrogativa do credor requerer a dívida toda de qualquer dos devedores solidários. Não há o benefício de ordem. Neste caso, o devedor solidário requerido pode chamar ao processo os demais devedores para aproveitar a sentença no sentido de obter ação regressiva contra os demais. Assenta-se essa prerrogativa na própria solidariedade, legal ou contratual.
Das hipóteses legais acima, infere-se que é impossível o chamamento ao processo se o réu for o devedor principal. Se o autor entrar com a ação contra o devedor principal, não há sentido neste devedor chamar ao processo os fiadores (ou solidários) pois, caso seja derrotado, não há o direito de regressão para com os fiadores (ou solidários).

Por fim, cabe salientar que, no chamamento ao processo, a relação jurídica mantém-se, e não se cria nova relação processual. Em outras palavras só é possível o chamamento ao processo de terceiro que já tivesse relação jurídica fundada nas mesmas bases em que o réu tem com o autor. O chamante e o chamado devem ser, naquela lide, co-devedores do autor.

Do ponto de vista processual completamos com algumas características adicionais do chamamento ao processo:
  • a falta de chamamento não implica na perda do direito de regresso. Portanto o chamamento é facultativo.
  • o réu requer a citação do chamado no mesmo prazo que tem para a sua defesa, ficando o processo suspenso nesse período (arts. 72 e 79 do CPC)
  • o chamado torna-se litisconsorte do réu
  • o litisconsórcio é simples. A lide pode ser decidida diferentemente para cada um deles.
  • o chamamento só é pertinente nos processos de conhecimento, não cabendo nos processos executórios e cautelares

DENUNCIAÇÃO DA LIDE

Visto o chamamento ao processo fica mais fácil conceituar a denunciação da lide. Faremos isso, inicialmente, diferenciando-a do chamamento.

A denunciação da lide também é intervenção de terceiros no processo. A diferença desta é que não há relação entre o denunciado e a parte oposta ao denunciante.

Reprisando, o processo inicia-se com a petição inicial e encerra-se com a sentença. Na petição inicial, ou autor define o réu (ou réus), aos quais a lide deva ser imputada.

Pode ser de interesse do autor, ou do réu, que naquele mesmo processo seja resolvida outra relação jurídica correlata, restando na sentença decisão que possa ser usada como título de execução dessa outra relação.

Os exemplos tornam mais claro. Imaginemos um acidente de trânsito, onde a vítima processe o causador do acidente. Teremos o autor (vítima) e o réu (causador do acidente). O que o autor pede do réu é a indenização material dos danos. Entretanto o réu tinha seu carro segurado. Portanto tinha uma segunda relação jurídica correlata à situação, com uma seguradora. Note que o autor não tem nada a ver com a relação entre o réu e sua seguradora. Pela denunciação da lide, o réu (neste caso) pode denunciar à lide a seguradora, trazendo-a para o processo. Caso o autor vença a ação contra o réu, pode o réu (se for o caso) obter, na mesma sentença, título executivo contra a seguradora (denunciada).

Outra característica da denunciação da lide é que, mesmo sendo ambas as relações decididas no mesmo processo, elas não são idênticas. Dessa forma esse incidente promove duas alterações: uma subjetiva, incluindo o denunciado na lide, e uma objetiva, agregando nova relação estranha à relação da petição inicial.

O objetivo da denunciação da lide é a economia processual, buscando resolver no mesmo processo duas situações que certamente se sucederiam. Por esse motivo, parte da doutrina defende que só se deve admitir a denunciação da lide se a sua apreciação possa utilizar-se do mesmo arcabouço probatório e processual da ação inicial. Caso contrario a denunciação prejudicaria processualmente a parte que não têm interesse na denunciação, visto que não faz parte da relação jurídica que a motivou.

O Código de Processo Civil prevê, no seu artigo 70, as seguintes hipóteses de denunciação da lide:
  • ao alienante, em ação em que terceiro reivindica a coisa, cujo domínio foi transferido à parte, a fim de que esta possa exercer o direito que da evicção lhe resulta. Esse é o único caso de denunciação obrigatória, ou seja, se o denunciante não denunciar, perde o direito que resulta da evicção (direito de regressão)
  • proprietário ou possuidor indireto quando, por força de obrigação ou direito, em casos como o do usufrutuário, do credor pignoratício, do locatário, o réu, citado em nome próprio, exerça a posse direta da coisa demandada. Acontece nos casos em que um autor aciona um réu a respeito de um imóvel, por exemplo, se o réu é apenas locatário do imóvel. Para que a eventual sucumbência nessa ação possa reverter em remissão desse locatário ao proprietário, pode o locatário chamar o proprietário à lide, por meio da denunciação da lide.
  • Àquele que estiver obrigado, pela lei ou pelo contrato, a indenizar, em ação regressiva, o prejuízo do que perder a demanda. Como a lei ou contrato já estipulam esse direito de regressão, resta ao denunciante apenas requerer o denunciado para esse fim.
Do ponto de vista processual, completamos com algumas características adicionais da denunciação da lide:
  • a denunciação da lide é possível mesmo a quem já é parte do processo, a outro título, desde que a relação entre o denunciante e denunciado seja distinta (mas correlata) à relação da causa original.
  • para não atrasar os procedimentos especiais, é vedada a denunciação da lide no procedimento sumário (CPC, art. 280, I), nos Juizados Especiais Cíveis (Lei 9.099/95, art. 10) e nas ações fundadas no Código do Consumidor (Lei 8.078/90, art. 88).
  • não cabe a denunciação da lide no processo executivo e no cautelar
  • caso o denunciante seja vitorioso na ação principal, julga-se prejudicada (sem exame de mérito) a denunciação
  • o CPC admite denunciações sucessivas (art. 73)

2 comentários:

  1. Muito bom, escreve com objetividade e clareza, porém, com o devido respeito, faltou complementar deixando com efetividade a diferença entre a Denunciação à Lide e o Chamanento ao Processo.A denunciacão ficou bem claro...

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    1. Mas...pela leitura do texto pode-se ver com clareza a diferença. grato pelo trabalho.

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