segunda-feira, 19 de outubro de 2009

Direito Civil III - Trabalho sobre relatividade dos contratos

O princípio da relatividade dos efeitos contratuais não é novo no nosso ordenamento jurídico. Este princípio define que os efeitos obrigatórios do contrato só devem ser sentidos pelas partes que o formaram. Entretanto, com as alterações qualitativas da moderna doutrina, e devido aos modernos conceitos introduzidos pela constitucionalização da antiga doutrina civil, vivenciamos algumas alterações nesse princípio.
A doutrina relativa aos contratos, formada com base na visão liberal de mundo, tinha como dois pilares fundamentais a liberdade formal e a autonomia da vontade. Esta última era pilar inafastável da relação contratual, absoluta em seus efeitos. Modernamente, não se admite mais princípios absolutos nesta seara. A moderna doutrina tem como base a busca da igualdade material e a defesa social da boa-fé, da função social e do equilíbrio contratual. Esses novos paradigmas afetaram a maneira como a relatividade dos efeitos contratuais se opera, conforme veremos.
No paradigma anterior vigiam três princípios baseados na autonomia privada: a autonomia da vontade, a obrigatoriedade dos contratos e a relatividade dos contratos.
A relatividade dos efeitos contratuais, nosso objeto, pode ser analisada por sua dimensão subjetiva e objetiva.

DIMENSÃO SUBJETIVA
A dimensão subjetiva visa delimitar os sujeitos que arcam com os efeitos obrigatórios do contrato. Estes são chamados as partes contratuais. As partes diferenciam-se dos terceiros pois estes não estão sujeitos aos efeitos obrigatórios do contrato, embora possam ser atingidos indiretamente pelos seus efeitos.
O paradigma anterior entendia que a manifestação da vontade era o elemento a ser considerado para distinguir as partes contratuais, sujeitas aos efeitos obrigatórios do contrato, e os terceiros, não submetidos aos efeitos contratuais obrigatórios. Só eram consideradas partes contratuais aqueles que manifestavam-se voluntariamente na relação contratual. Os demais, que não manifestaram sua vontade, eram os terceiros da relação contratual. A moderna doutrina, entretanto, entende que a distinção entre partes e terceiros não deve basear-se unicamente na autonomia da vontade.
Neste novo paradigma há um alargamento da noção de partes. O jurista Jackes Ghestin, por exemplo, desenvolve a diferenciação entre partes e terceiros levando em conta a teoria a utilidade do contrato, em outras palavras, de acordo com a sua função social. Catherine Guefulcci-Thibierge, por sua vez, afirma que a definição das partes contratuais não se dá somente no momento da formação do contrato, mas também em decorrências de normas legais. Como exemplo desse imperativo legal temos o nosso código de defesa do consumidor que atribui responsabilidade do vendedor sobre a qualidade de um produto mesmo quando esta qualidade for reclamada por quem não foi efetivamente o comprador daquela mercadoria, portanto um terceiro relativo àquela relação de consumo inicial.
Entretanto, parece ser a conclusão de que mesmo com o alargamento do conceito de partes, não é de se coadunar que a relatividade dos contratos permita que se crie obrigações para terceiros estranhos à manifestação da vontade de contratar. Nas palavras de Diogo de leite Campos: "O princípio da relatividade dos contratos só não atua quando as partes quiserem atribuir uma vantagem ao terceiro. Nos casos em que há encargos, e mesmo que os benefícios ultrapassem os encargos, esta intromissão não só não se pode presumir no interesse do terceiro, como não é necessária tecnicamente."
Assim não se pode definir partes e terceiros apenas pelo pólo subjetivo do princípio. Vejamos então seu polo objetivo.

DIMENSÃO OBJETIVA
O plano objetivo analisa os efeitos do contrato, sua eficácia contratual, tanto para as partes quanto para terceiros. A eficácia pode-se dividir em constitutiva e normativa. A constitutiva é a própria criação da norma contratual, onde as partes definem as obrigações. A eficácia normativa é a definição de qual esfera será atingida pela norma criada, ou o seu alcance. Como a norma foi criada pelas partes entende-se que sua eficácia normativa obrigatória só se dê perante aqueles que a criaram.
Mas percebe-se que, em alguns contratos, pela forma como são celebrados, acabam por produzir efeitos externos às partes. Desta forma também podemos definir a eficácia como direta, ou seja, que produz efeitos dentro da relação jurídica (obrigatória entre as partes) e a indireta, que extrapola seus efeitos para além das partes (relativo a terceiros).
Assim, quando se fala em princípio da relatividade dos efeitos contratuais decerto se fala apenas da eficácia direta que este contrato produz. Os efeitos indiretos são aqueles relativos à oponibilidade. A oponibilidade é a necessidade de respeito por terceiros do fato jurídico concluído pelas partes. Ocorre quando as partes fundam contatualmente, por exemplo, uma pretensão comum em relação a um terceiro ou se oponham a alguma pretensão de celebração de negócio entre as partes e este terceiro. Caso o contrato entre as partes possa ferir interesse de terceiros este possui o direito de se insurgir contra o contrato, mesmo não fazendo parte dele. É uma exceção à relatividade tradicional dos contratos. Como se vê, trata a oponibilidade da eficácia indireta dos contratos.


Em suma, podemos entender que os efeitos obrigatórios do contrato consistem na observância da regra contratual e na proteção do contrato sobre as relações ou situações objetivamente contempladas no contrato, enquanto a eficàcia indireta é aquela que se desenvolve através das situações criadas ou modificadas pelo contrato. A eficácia direta só atinge terceiros quando a lei assim o exigir, e na medida dessa exigência. A eficácia indireta diz respeito a terceiros, que podem vir a participar da relação contratual na medida em que essa relação lhe altere interesses.
A relatividade dos contratos, desta forma, não pode ser vista como princípio absoluto, mas deve coadunar-se com a função social do contrato e ao princípio da boa-fé, permitindo que interesses de terceiros e de toda a sociedade sejam considerados na relação contratual.

Um comentário:

  1. Olá, Boa tarde, Com base em qual doutrinador esse trabalho foi realizado? Obrigado desde já.

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